Notas Sobre a Pandemia – Yuval Noah Harari

Não vejo tanto sentido em escrever uma resenha sobre esse livro, prefiro muito mais pegar trechos interessantes e colocar aqui pra que você fique na vontade de fazer essa leitura. 

Yuval Noah Harari é o autor best-seller de Sapiens, e nesse livro ele colocou partes de artigos publicados entre os meses de Março e Junho de 2020… por já estarmos em 2021 você pode ler algumas coisas que já superamos, mas vale ter o entendimento aqui. 

”O maior risco que enfrentamos não é o vírus, mas os demônios interiores da humanidade: o ódio, a ganância e a ignorância. Podemos reagir à crise propagando ódio: por exemplo, culpando estrangeiros e minorias pela pandemia. Podemos reagir à crise estimulando a ganância: por exemplo, explorando a oportunidade para aumentar os lucros, como fazem as grandes corporações. E podemos reagir à crise disseminando ignorância: por exemplo, espalhando e acreditando em ridículas teorias da conspiração. Se assim reagirmos, será muito difícil lidar com a crise atual, e o mundo pós-covid-19 será um mundo desunido, violento e pobre.” 

”Epidemias matavam milhões de pessoas bem antes da atual era da globalização. No século XIV, não havia aviões nem cruzeiros, e no entanto a peste negra disseminou-se da Ásia Oriental à Europa Ocidental em pouco mais de uma década. Em março de 1520, um único hospedeiro da varíola — Francisco de Eguía — desembarcou no México. Na época, a América Central não tinha trens, ônibus, nem mesmo jumentos. No entanto, por volta de dezembro uma epidemia de varíola já devastava a América Central inteira, matando, de acordo com algumas estimativas, quase um terço de sua população.” 

”Em 1918, uma cepa de gripe particularmente virulenta conseguiu se propagar em alguns meses pelos cantos mais remotos do planeta. Infectou meio bilhão de indivíduos — mais de um quarto da espécie humana. Estima-se que a gripe tenha matado 5% da população da Índia. No Taiti, 14% dos ilhéus morreram. Em Samoa, 20%. Ao todo, a pandemia matou dezenas de milhões de pessoas — chegando talvez a 100 milhões — em menos de um ano. Foi mais do que se matou em quatro anos de batalhas brutais na Primeira Guerra Mundial.” 

”Apesar de episódios terríveis, como o da aids e o do ebola, no século XXI as epidemias matam uma proporção muito menor de pessoas do que em qualquer outra época desde a Idade da Pedra. Isso porque a melhor defesa que os humanos têm contra os patógenos não é o isolamento, mas a informação. A humanidade tem vencido a guerra contra as epidemias porque, na corrida armamentista entre patógenos e médicos, os patógenos dependem de mutações cegas, ao passo que os médicos se apoiam na análise científica da informação.” 

”Quando a peste negra ou a varíola fizeram uma visita, a melhor ideia que ocorreu às autoridades foi organizar grandes orações a deuses e santos. Não ajudou. De fato, quando uma multidão se junta para rezar, o resultado costuma ser infecção em massa. Ao longo do último século, cientistas, médicos e enfermeiros ao redor do mundo compartilharam informações e juntos conseguiram compreender tanto o mecanismo por trás das epidemias quanto os modos de combatê-las.” 

”Enquanto os medievos nunca puderam descobrir a causa da peste negra, os cientistas levaram apenas duas semanas para identificar o novo coronavírus, sequenciar seu genoma e desenvolver um teste confiável para detectar pessoas infectadas.” 

”A cooperação internacional é também necessária para medidas eficazes de quarentena. A quarentena e o toque de recolher são essenciais para interromper a propagação da epidemia. Mas quando os países não confiam uns nos outros e cada nação sente que está por conta própria, os governos hesitam em adotar medidas tão drásticas. Se você descobrisse cem casos de coronavírus em seu país, você isolaria imediatamente cidades e regiões inteiras? Em boa medida, isso depende do que você espera dos outros países.” 

”Nos anos 1970, a humanidade conseguiu derrotar o vírus da varíola porque todas as pessoas em todos os países se vacinaram. Bastava que um único país não vacinasse sua população para que a humanidade inteira ficasse exposta ao perigo, pois, enquanto o vírus da varíola existisse e evoluísse em algum lugar do mundo, sempre poderia voltar a propagar-se por toda parte.” 

”Hoje, a humanidade enfrenta uma crise aguda não apenas por causa do coronavírus, mas também pela falta de confiança entre os seres humanos. Para derrotar uma epidemia, as pessoas precisam confiar nos especialistas, os cidadãos precisam confiar nos poderes públicos e os países precisam confiar uns nos outros. Nos últimos anos, políticos irresponsáveis solaparam deliberadamente a confiança na ciência, nas instituições e na cooperação internacional. Como resultado, enfrentamos a crise atual sem líderes que possam inspirar, organizar e financiar uma resposta global coordenada.” 

”Quando uma população tem conhecimento dos fatos científicos, e quando acredita que as autoridades públicas divulgarão esses fatos, seus cidadãos podem fazer a coisa certa sem um Grande Irmão a monitorá-los de perto. Uma população bem informada agindo por conta própria costuma ser muito mais poderosa e efetiva do que uma população ignorante e policiada. Considere-se, por exemplo, o hábito de lavar as mãos com sabão. Esse foi um dos maiores avanços históricos no campo da higiene humana. Esse simples gesto salva milhões de vidas todos os dias. Embora pareça muito natural, foi apenas no século XIX que os cientistas descobriram a importância de fazê-lo. Antes disso, mesmo médicos e enfermeiras passavam de uma operação cirúrgica à próxima sem lavar as mãos. Hoje, bilhões de pessoas lavam as mãos diariamente, não por temerem a polícia do sabão, mas por compreenderem os fatos. Lavo minhas mãos com sabão porque já ouvi falar de vírus e bactérias, compreendo que esses organismos minúsculos causam doenças, e sei que o sabão é capaz de removê-los.” 

”A humanidade precisa fazer uma escolha. Seguiremos pela rota da desunião ou adotaremos o caminho da solidariedade global? Se optarmos pela desunião, isso não apenas prolongará a crise como provavelmente resultará em catástrofes ainda piores no futuro. Se escolhermos a solidariedade global, será uma vitória não só contra o coronavírus, mas contra todas as crises e epidemias futuras que podem vir a se abater sobre a humanidade no século XXI.” 

”Os humanos morrem não porque Deus assim determinou, mas por causa de alguma falha técnica. O coração para de bombear sangue. Um câncer destrói o fígado. Vírus multiplicam-se nos pulmões. E a que se devem todos esses problemas técnicos? Outros problemas técnicos. O coração para de bombear sangue porque não recebe oxigênio suficiente. Células cancerígenas se espalham pelo fígado devido a alguma mutação genética aleatória. Vírus instalam-se nos meus pulmões porque alguém espirrou no ônibus. Não há nada de metafísico nessas coisas. E a ciência acredita que todo problema técnico tem uma solução técnica. Não precisamos esperar a segunda vinda de Cristo para superar a morte. Alguns cientistas num laboratório podem resolver a questão. Se antes a morte era tradicionalmente a especialidade de padres e teólogos de batina negra, agora contamos com a turma do jaleco branco. Caso o coração falhe, podemos estimulá-lo com um marca-passo ou mesmo providenciar um transplante. Se um câncer aprontar alguma coisa, podemos matá-lo com radiação. Se os vírus se proliferam nos pulmões, podemos neutralizá-los com algum medicamento. Claro, no momento, não podemos resolver todos os problemas técnicos possíveis. Mas trabalhamos para isso. As melhores mentes humanas já não gastam seu tempo tentando dar um sentido à morte. Em vez disso, ocupam-se em prolongar a vida. Investigam os sistemas microbiológicos, fisiológicos e genéticos responsáveis pelas doenças e pelo envelhecimento e desenvolvem novos remédios e tratamentos revolucionários. 

Em seus esforços para prolongar a vida, os humanos têm sido notavelmente bem-sucedidos. Nos últimos dois séculos, a expectativa de vida média saltou de menos de quarenta anos para 72 no mundo inteiro, e para mais de oitenta em alguns países desenvolvidos. As crianças, em especial, estão muito mais bem protegidas contra as garras da morte. Até o século XX, pelo menos um terço delas não alcançava a idade adulta.” 

”Quando a vacina ficar de fato pronta e a pandemia chegar ao fim, qual será a principal lição que a humanidade extrairá disso tudo? Muito provavelmente, que precisamos dedicar ainda mais esforços à proteção das vidas humanas. Precisamos de mais hospitais, mais profissionais de medicina e enfermagem. Precisamos estocar mais respiradores, mais equipamentos de proteção, mais kits de testagem. Precisamos investir mais dinheiro na pesquisa de patógenos desconhecidos e no desenvolvimento de novos tratamentos. Não podemos ser pegos desprevenidos de novo.” 

”Mas, nos dias de hoje, mesmo a maior parte dos grandes irradiadores da tradição põe sua confiança na ciência em vez de nas escrituras. A Igreja católica instruiu os fiéis a manterem-se longe das igrejas. Israel fechou todas as sinagogas. A República Islâmica do Irã tem desencorajado a visitação às mesquitas. Templos e seitas de todos os tipos suspenderam as cerimônias públicas. E tudo porque cientistas fizeram alguns cálculos e recomendaram o fechamento desses espaços sagrados.” 

”Por séculos a fio, as pessoas usaram a religião como um mecanismo de defesa, acreditando que existiriam para sempre no pós-vida. Agora passaram a usar a ciência como um mecanismo de defesa alternativo, acreditando que os médicos sempre os salvarão, e que viverão para sempre em seus apartamentos. Precisamos de uma abordagem equilibrada nesse ponto. Devemos confiar na ciência para lidar com epidemias, mas ainda precisamos suportar o fardo de lidar com nossa mortalidade e nossa transitoriedade como indivíduos.” 

”Espero que as pessoas se lembrem da importância da informação científica confiável mesmo depois de passada a crise. Se queremos usufruir da informação científica confiável em um momento de emergência, devemos investir nela em tempos normais. A informação científica não cai do céu, nem brota da mente de gênios individuais. Ela necessita de instituições independentes e fortes, como universidades, hospitais e jornais. Instituições que não apenas pesquisem a verdade, mas que também sejam livres para dizer a verdade às pessoas, sem medo de serem punidas por governos autoritários.” 

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